MUITAS SAUDADES DA VARIG
Hoje um transbordo aéreo que necessite da utilização de um aeroporto norte-americano é uma penitência para um pecado não cometido. Você é tratado como um verme, a ser escrutinado por gorilas, que não sabem sequer assinar seu próprio nome, mas que se julgam autoridades divinas. Se não divinas, como poderes divinos...
Já tenho meu kit de viagem. Relógio com correia de borracha. Sapato sem cadarço, abolição do cinto, correntes e celular no bolso do casaco, que tem que ser tirado do corpo, nenhum chapéu e um computador que possa ser facilmente acessado e retirado da mala de mão. Logo, passo fácil em meu teste de não terrorista. O problema é que muitos que estão à sua frente não. E ai a filha dura... dura... que nem o coelhinho da Duracell. Você mofa. E o principal de tudo. Você tem que se manter sorrindo e tentando transmitir as autoridades, que tudo está correndo as mil maravilhas. Seu tempo não vale merda nenhuma e se você perder o avião, paciência, sempre haverá outro e afinal de contas, o que são mais 4 horas de espera em um aeroporto?
Quarenta e cinco minutos para se livrar do balcão da TAM e 30 minutos para se vencer as autoridades, já lhe comeram mais do que uma viagem na ponte aérea, Rio-São Paulo.
O passo seguinte nas agruras de se enfrentar um vôo de uma companhia brasileira é a entrada na aeronave. Tem gente que coloca um travesseiro na barriga para pode passar por grávida. Outros que mancam momentaneamente e até aqueles que adotam a criança ao lado. Tudo na ânsia de entrar no avião na frente dos outros. E a luta pelos compartimentos acima da cabeça. Em avião de brasileiro, entrou no final, não hã lugar para se colocar as malas.
Brasileiro faz fila para tudo, mas quando a coisa é relativa a transporte ele extrapola. Quer ser o primeiro, embora no caso dos aviões o lugar é marcado. Nas empresas estrangeiras, a maioria respeita a chamada pela ordem determinada no talão de embarque. Eu disse a maioria, não todos, pois, sempre haverá um brasileiro, tentando tirar a sua vantagem, mancando, adotando uma criança, vocês já sabem como...
Ai ele entre e começa o exaustivo jogo das poltronas. Quando sabe que existirão lugares vagos, passam a espalhar suas coisas por duas, três ou quatro filas de forma a, quem sabe, poder viajar deitado. Quando não o consegue, xinga até a mãe do dono da empresa aérea. Não seria mais fácil se adquirir um bilhete de primeira classe ou business?
Mas há de se convir que há sempre aquela esperança que você não tenha que sentar do lado de um gordo que ocupa dois bancos, ou daquela senhora que é a cara de sua avó, mas que, ao contrário da mesma, baba em seu ombro, do senhor muito simpático, mas que quando adormece, ronca qual uma trituradora de cimento ou daquela criança que chora a noite toda e vomita durante a viagem, longe do vestido de sua mãe.
Tem gente que tem sorte e senta ao lado da Gisela Bunchem, outros do JÔ, que embora ocupe dois bancos o faz sorrir, mas eu não. Sempre me sento do lado de alguém que não gostaria de sentar. Seria penitência pela boa vida que vivi até aqui? Provavelmente.
Disse na primeira parte desta crônica, que sou do tempo da Panair e tenho muitas saudades da Varig. E vocês sabem porque? Porque o serviço de bordo era humano e as aeromoças também.
Hoje a comida de avião tem gosto de plástico e as aeromoças parecem ser feitas deste mesmo material. Sorriem, falam, mas são incapazes de notá-lo. Eu digo as aeromoças, não a comida. Para esta impolutas senhoritas – em sua maioria e senhoritos em quase a sua totalidade - você nada mais é do que um ser inoportuno que não, a ou o, deixa dormir e folhear a Caras.
Esta é a sua posição dentro de um avião. A de um inoportuno. Apertado pelo excessivo número de assentos, e achatado pela significativa pressão de uma tripulação que parece estar ali apenas para o coibir, nunca para o ajudar.
O comandante de vôo, que tem sempre um sobrenome forte, Falcão, Aguiar, Soledade, e que além disto parece ter se esmerado em seu curso de impostação de voz do que em horas de vôo, tem sempre as mesmas piadas e as mesmas informações. Para que diábos precisamos saber, em todo santo vôo, a altitude e a temperatura que está fazendo lá fora? Não acredito que ninguém esteja propenso a sair para dar uma volta e nem que eles aceitem um pedido de um passageiro no tocante a uma mudança de altitude. Mas é praxe. Como praxe é aquela demonstração dos tripulantes de bordo para a apresentação do da necessidade do uso do cinto, das máquinas de oxigênio e das saídas de emergência, com aquela calma própria dos que nunca entram em pânico.
Mas aguardem, a viagem nem começou..