segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O MERCADO DO CAVALO DE CORRIDA


Condenados à catarse
ou ao diletantismo espúrio






Amigos do facebook me perguntam constantemente como funciona o mercado em que vivo e trabalho: o de cavalos de corrida. E a eles respondo: é meio complicado de se entender se você não estiver engajado no mesmo. Meu pai mesmo, nunca entendeu para que uma pessoa precisa de um cavalo. Mas vamos tentar colocar alguns pingos nos is.

Muitos anos atrás, um cliente, que praticamente iniciou comigo sua jornada como proprietário, disse muito perto de a nossa associação chegar ao fim, que eu era um poeta. Não sei com que fito o fez. Sórdida aleivosia. Impossível de se conceber, em se tratando da pessoa educada que era e é. Outrossim, se não foi um elogio, desculpe-me, mas assim o entendi. Porque cavalos de corrida são, para mim, poetry in motion.

Vou a um exemplo que já dei. O cinema e a televisão, guardadas as devidas proporções, são outras formas de colocar movimento em uma poesia. Porque me preocupei em frisar, guardadas as devidas proporções? Diria que o cinema é uma arte. Muitos a rotulam de sétima. O problema do cinema é que ele é reducionista, simplificador em sua essência. O grande texto literário de centenas de páginas vira uma dezena em um screen play e os diálogos passam a fazer parte de um script. A adaptação do livro ao cinema tem que ter no máximo duas horas de duração. Por isto, você muitas vezes escuta aquela celebre frase: gostei mais do livro.

E a televisão? Tem menos de uma hora, com intervalos de dois minutos de anúncios, dentro de sua programação? É bem verdade, que este veículo tem a vantagem de poder utilizar capítulos e seqüências. O problema é que a televisão nunca quis assumir a posição de veículo cultural. Trata-se, pura e simplesmente de um veículo de comunicação de massa, dirigido por pessoas que, basicamente, pensam em lucros, e transmitem a informação, orquestrada, para um público passivo e em sua grande maioria, de fácil manipulação. Mas, não quero me afastar muito do assunto principal.

Deixemos de lado a pulcritude de mentes doentias e levemos em conta que o cavalo de corrida é uma poesia em movimento. O ritmo, a rima, as concordâncias e a beleza, estão todas inseridas nele: em seu pedigree, nas suas formas e em sua mecânica de locomoção. Não pode se observar esta obra da natureza, polida pelas mãos da monarquia inglesa, de outra forma. Se não, estaremos condenados à catarse ou ao diletantismo espúrio. Eu ouvi de tudo. Proprietários afirmarem serem capaz de ver a alma do cavalo”, veterinários que conseguem “entrar na mente dos mesmos”, treinadores que afirmam “poder se comunicar com aqueles que treinam, enfim, existem distintas formas de expressar seu conhecimento pelo objeto em questão. Não dúvido de nenhuma delas. E porque? Porque para mim, cavalo é sentimento. Você o sente e o elege. Na realidade quando se sente o cavalo, é ele que o elege. Você precisa apenas estar atento. Os resultados simplesmente definem quem está falando sério, daqueles que vivem das lorotas. Que diga-se de passagem compõem a grande maioria. Mas existem hoje leis que coíbem os excessos.

Temos que obliterar esta concisão cortante de querer tratar a criação de cavalos de corrida, como uma atividade, norteada pelo fator de sorte. Existe uma ciência por trás dela e um lucro financeiro tanto em pista quanto na reprodução.

O cavalo de corrida emprega a muitos. Para aqueles que lidam diretamente com ele, alimentando-o, escovando-o e levando-o todo o dia para seu treinamento na pista, diria ser uma mão de obra muitas vezes despreparada para outras atividades. Logo se alijados de suas mínimas responsabilidades poderão tranquilamente adentrar na marginalidade. Logo, é o importante ao governo, a manutenção dos mesmos em seus empregos.

Nos Estados Unidos, antes da crise era a oitava atividade dentro do quadro de importância financeira e na Irlanda até poucos anos o primeiro. Agora perde para a industria da informática. Creio que isto por si só delimite a importância deste mercado a nível mundial. Determina melhoria social a quem dele participa, pois, você passa a ter acesso a gente que normalmente seria muito difícil de ter contato fora de um hipódromo. Uma carreira faz você poder estar sentado na mesma mesa que Aga Khan, ou Andrew Lloyd Weber.

As vendas de Keeneland, que hora participo, são as principais em relevo no mundo. Mas existem outras de tal importância, na Inglaterra, na França, na Irlanda, no Japão e na Austrália, apenas para se citar as mais concorridas. Movimentam-se bilhões de dólares anuais. Gente do mundo inteiro, comparece quatro vezes ao ano a Lexington, Kentucky, para particpar destas vendas. Sheikhs, magnatas, e gente como eu que trabalha como agente para estas pessoas.

No Brasil, temos um mercado de moderada importância financeira, mas hoje contamos com cerca de 4,000 éguas de cria da raça PSI, as que são destinadas as corridas. Todas cadastradas dentro de um Stud Book, aqui, como o são em todas as partes do mundo.

Com mais calma um dia vou me ater aos feitos que os cavalos brasileiros já conseguiram fora de nossas fronteiras, aos verdadeiros números e os mais importantes participantes do mercado. É um outro mundo, mas acredito que muito interessante de se conhecer.