JOGANDO CONVERSA FORA
Vocês naturalmente já devem ter pelo menos uma vez ouvido aquela famosa frase: “me deu aqueles cinco minutos e eu aí...” Pois é, quando dá aqueles cinco minutos muita coisa - que normalmente não está acostumado de se fazer - se faz. E aí vem as consequências. E o culpado são aqueles cinco minutinhos...
Nós brasileiros, em principal nós os cariocas, sempre fomos fascinados por frases bombásticas. Aquelas que reverberam nos tímpanos alheios e constituídas sem o menor, ténue e longínquo, vínculo racional. Como falar é de graça, nos arvoramos em fazê-lo, não medindo consequências.
Donos de um impudor próprio mantemos certos requintes de sociabilidade. Outrossim, jogamos frases ao vento. Frases como uma que está na boca de toda e qualquer mulher. E neste caso preciso, não há exceções, nem entre as modelos profissionais. A frase comentário a que me refiro é aquela: “preciso perder dois quilinhos...” A dita cuja pode não necessitar perder um quilo sequer, ou ao contrário necessita emagrecer no mínimo 20, mas a frase sempre será a mesma. Não se modifica. Um cliché, que exige de sua parte aquela resposta que ela quer ouvir: “você está perfeita, não precisa perder quilo algum”.
E o que dizer daquelas convicções assumidas que funciona como uma espécie de promessa, sempre feitas depois de uma noite de Sábado de excessos etílicos e gastronômicos: “de segunda feira não passa. Inicio minha ginástica”. E quantos iniciam? “Semana que vem entro em um regime sério”. Quantos o fazem?
O brasileiro não nasceu para cumprir aquilo que promete a si próprio. Quanto mais aos outros. Nos falsificamos diariamente sem sentir que o fazemos. Somos os reis do deixe comigo, amanhã eu faço e do pungente, plangente. O carioca, por exemplo, se despede pedindo que o outro telefone, mas é incapaz de deixar o número do mesmo. Nunca chega na hora e culpa o trânsito, mesmo que tenha vindo a pé. Adoram o amontoado. Ver cinco pessoas reunidas em uma esquina nos atrai a juntarmo-nos a elas. Vislumbrar alguém parado olhando para o alto de um edifício, o faz parar e procurar por aquilo que aquele outro está fixando sua atenção. Temos orelhas vibrantes e curiosidades intrínsecas. Nascemos para viver e deixar que as coisas simplesmente acontecem. Sem muita programação. Esta é a nossa natureza.
Pois é, estamos acostumados a esta forma de ser assim como os chavões. Os repetimos como se fossem originais. Deveríamos prometer menos coisas a nós mesmos e agir mais em nosso favor. Porém, não é fácil. Fácil é chupar chicabon.
Vamos e venhamos, nos dias de hoje as atribulações são intensas. A gente aproveita cada minuto da existência, pois a mesma tecnologia que pretensamente veio para nos facilitar a vida, acaba mesmo nos escravizando. Aqui na Florida, é impossível se ver uma mulher dirigindo que não esteja falando em seu celular. Quando você acha uma, pode jogar o que tiver no bolso que é surda. Não sei se a moda do celular na direção pegou ai no Brasil.
Mas aqui entre nós eu sinto muita falta desta desorganização. Desta forma de encarar a vida como nós brasileiros encaramos. Na Flórida, um Rio de Janeiro cheio de cubanos e russos, e repleta de canadenses no inverno, não tem este jogo de cintura. As pessoas igualmente não cumprem aquilo que combinam, nunca chegam na hora marcada, mas o fazem sem o allure brasileiro.
Foi para mim muito difícil de deixar de ser carioca e me transformar em um floridiano. Que na realidade é um carioca que não deu certo.
A espontaneidade com que cometemos nossos erros, não tem nada igual. Nem aqui, nem em lugar algum. Ser brasileiro é uma dádiva. Mesmo com características distintas, o nortista, o nordestino, o sulista e mesmo o carioca, tem uma espinha dorsal nitidamente gêmea. Falamos uma mesma língua espiritual, dentro ou fora d’água. Não temos torvos ressentimentos por nada. Apagamos com rara facilidade as agruras de nossa cabeça e temos um otimismo cego, doentio, avassalador, pelos sonhos que povoam nossos pensamentos. Isto é que faz do Brasil, uma pais distinto. Isto é que germina a saudade em todo brasileiro que vive longe de seu solo.
No futebol, no carnaval, enfim, em qualquer tipo de expressão popular, agimos muito mais com o coração de com o cérebro e desandamos a dizer frases que para muitos parecem desconexas. Mas não o são para nós.
Jogamos conversa fora. Creio que depois do futebol, seja este o nosso maior divertimento. Nos damos ao luxo de ter aqueles cinco minutos. De chegar atrasados a nossos compromissos, sabedores que o outro igualmente chegará. E no caso das mulheres, de achar necessário a perda daqueles dois quilinhos.