quinta-feira, 5 de novembro de 2009

EM BOCA FECHADA NÃO ENTRA MOSQUITO


QUE TAL UM PICOLÉ ?






Não dizer nada, talvez seja a atitude menos drástica que alguém possa tomar perante o absurdo. Mas há de se convir que se todos tomarem esta atitude, o absurdo se torna uma normalidade e outros absurdos ainda maiores, se seguirão ao mesmo. Daí ao caos, é menos que um passo.

Assim sendo, dizer-se o que pensa, é sempre a melhor solução. Nem sempre a mais segura, certamente não a mais cautelosa, porém, a menos retroativa. A omissão, o levará a uma crudelíssima solidão.

Tenho um certo temor destes lambedores do silêncio. Em boca calada não entra mosquito, diria minha vó Adelina, mas não sai também o que se pensa, completaria eu, por conta própria. O calado é um soturno, capaz das mais hediondas torpezas e de grandiosas imposturas. Trabalha com o olhar e o trejeito assumido por seus lábios, perante os comentários alheios. Parecem insuscetíveis ao espanto, à opinião, e a mera troca de idéias. Denotam possuir um inexorável automatismo. Os rotulo de, comem calados. Lá estou eu voltando a rotular...

Não sou assim, embora prefira ouvir a falar. Gosto mesmo de escrever, pois, o que se escreve fica lavrado. Escrever é uma prova de responsabilidade, embora tenha muita gente que se torna um irresponsável com uma caneta às mãos. Mas pelo menos quando isto acontece, os identificamos. Ao calado, nunca.

Quando se critica os problemas de uma cidade, imediatamente os arautos do apocalipse o acusam de não gostar desta cidade. Doce ilusão. Ledo engano. A gente critica também aquilo que gosta, porque quer que o objeto de sua afeição melhore e não decresça em seu conceito e estima. Isto acontece de pai para filho, de irmão para irmão, de amigo para amigo.

Diz-se a boca pequena que os amigos não têm defeitos. Aos seus olhos talvez. Todavia, é mentira. Todos os têm. Até São Francisco de Assis os tinha. O que acontece é que você releva estes defeitos, mais até do que o faria em relação a um parente ou mesmo seu vizinho.

Somos poços de defeitos. Todos nascemos com avarias. O tempo apenas as acentua. Todavia diria que os gostos de um recém nascido são superiores aos nossos. O problema é que ele cresce e virá um de nós. Não existe uma criança sequer que consiga tomar café. Aquele gosto as repudia. Outrossim, quando cresce, todos tomamos café e alguns até se viciam na prática. O mesmo pode ser dito do cigarro. Nenhum recém nascido o aceita, mas o tempo faz alguns aderirem à pratica.

O que isto quer dizer? Nós nos estragamos por contra própria, ou somos estragados por aqueles que nos cercam. Isto são inexcedíveis verdades. Doa a quem doer.

Porque faço este relado? Porque acredito que em tom castamente informativo, que poderíamos ser melhores do que realmente somos. Deveríamos ter corpos mais maleáveis, já que assim nascemos e depois nos deixamos endurecer. Quando pequenos aprendemos qualquer idioma. Vejam como os chineszinhos desde pequenininhos falam chinês. Mas emburecemos” nosso cérebro com uma porção de informações que não nos valem de absolutamente nada e temos dificuldade de aprender outro idioma com o aumento da idade.

A única coisa que possuímos de melhor em relação as crianças, é termos conseguido controlar nossas genéticas incivilidades. Há um automatismo na fúria da antes puberdade. A criança é um egoísta por formação. Cabe aos pais domar estas anomalias. Os não domados assim se mantém e dificilmente serão pessoas felizes.

Não gosto de quarto escuro e nunca me vi sozinho em uma ilha perdida. Gosto de estar só, mas no campo auditivo dos sons do dia a dia. Sinto falta do outrem. Do barulho das ondas e das gotas de chuva no vidro. Nem sempre das pessoas, mas quase sempre da certeza de saber de sua existência. É que nem aquela história de morar em New York, nos preços abusivos que aquela cidade existe.

Você não come todo dia em restaurante, não freqüenta a Broadway todas as semanas, não vive dentro de museus, nem mesmo se dá ao luxo de comparecer a todas as óperas, bales e espetáculos sinfônicos. Mas saber que tudo isto está ali, ao alcance de suas mãos, o agrada. Pelo menos a mim, me deixa tranqüilo. Para mim, o problema é estar inacessivelmente” localizado, longe disto tudo.

Convivo na solidão de meus passos e nas propriedades de meus próprios pensamentos. Convivo, mas não vivo. Preciso dos outros para refletir e ser refletido na luz de minha existência.

No mais, que tal um picolé?