quinta-feira, 29 de outubro de 2009

NÃO MAIS VOU AO RIO, APENAS AO LEBLON

IMPOSTOS DE PRIMEIRO MUNDO
SERVIÇOS DE TERCEIRO MUNDO








Outro dia me perguntaram porque sendo eu tão apaixonado pelo Rio de Janeiro, não vinha morar de volta no Brasil. Minha resposta foi imediata: O problema do Brasil é que lá pagamos impostos de primeiro mundo, mas recebemos de volta serviços de terceiro mundo.

Nossas estradas são lastimáveis, o estado de manutenção de nossas avenidas impublicáveis, o trânsito é caótico, a segurança não existe, você pisa em bosta de cachorro, os carros usam as calçadas de estacionamento e tem fila para tudo. O resto é bom.

Nos Estados Unidos, a vida é um tanto ao quanto enfadonha (menos em New York, San Francisco, Chicago e Miami), mas pelo menos você vê para onde vai o seu imposto. Se cai, porque um bueiro está aberto ou devido a um buraco na rua, o governo está em palpos de aranha. As indenizações aqui são pesadas e o mais importante, são pagas. O que acontece no Rio de Janeiro se você cai vitima de uma cratera?

O Rio dos anos 60 e 70, não digo que fosse melhor, mas era distinto. O ritmo era mais brando e se tinha tempo para tudo. Por exemplo, eu não perdia um por do sol no Arpoador. Eu no Arpoador em minha moto e o sol caindo no mar, à esquerda dos Dois Irmãos. Eram espetáculos inesquecíveis. Hoje nem mais de carro você pode chegar ao Arpoador. E se você fica olhando muito para o sol, afanam-lhe a carteira.

Tenho saudades das corridas de submarinos, ali mesmo no Arpoardor, do fim de tarde no Castelinho, das frescuras do Pier, dos biquines da Montenegro, do ambiente do Veloso, da piscina do Copa, do beco das garrafas, do filé com fritas do Antônios, da laranjada do Bob’s, do macarrão amigo da segunda feira no Jirau, da pizza da Fiorentina, da sorveteria Moraes, do sanduíche de pernil com abacaxi do Cervantes, da mansidão da Lagoa, do chocolate quente do Esquilos, do cachorro quente na orla da praia e até da Confeitaria Colombo, a de Copacabana. Enfim, daqueles que eram os pontos de encontro de meu tempo. Mas todos se foram. Com elas minhas memórias.

Morar é conviver. É aproveitar seu quarteirão como este fosse o seu universo. Em New York se você mora no upper east side, entre a Park Lane e a York, você tem todo um mundo a lhe favorecer. Tem a cercania do parque, a do Metropolitan Museum, o Gugenhein e atravessando aquele imenso pedaço de verde, para o sul a Broadway, para leste o Lincoln Center. O que você precisa mais?

Você toma café no E.A.T, tem 30 opções de restaurantes para almoçar e a noite o JJ Mellon para um hamburger e saber o que  acontecera pelo mundo. E durante todo o dia, o mundo vinha a você. O Rio de Janeiro dos anos 70 e 80 era mais ou menos assim. Você via o Tom Jobim, o José Carlos de Oliveira, a Duda Cavalcanti e o Chico Buarque quase que todos os dias. Pareciam até íntimos. O quarteirão era mais amplo, ia da subida da Niemayer ao túnel da Avenida Princesa Isabel. Aquele era o meu mundo. O meu universo. Foi bárbaro enquanto durou.

Vou tentar me explicar melhor. Quando você muito jovem se apaixona por uma menina, tem com elas grandes momentos e um dia a coisa acaba. Acaba. Querer trinta anos depois reencontrá-la e achar que ela é a mesma, e o que os sentimentos e as sensações se repetirão com o mesmo ardor, esqueça. É preferível o que restou nas lembranças do que a tentativa de revivê-los, em carne e osso. Normalmente mais carne do que propriamente osso...

A vida é uma só e se anda apenas para frente. Nunca se deve olhar para trás. Apenas as suas lembranças trazem aquilo que você deixou às suas costas. “Quem muito olha para trás acaba topando à frente numa pedra”, já dizia minha vó Adelina.

Querida Maria Cristina, o Rio de Janeiro é bom demais, tenho incríveis recordações e ainda grandes amigos, mas diria que foi um rio que passou em minha vida...” Sempre que escuto o Sábia, “vou voltar sei que ainda vou voltar para o meu lugar...” me lembro da vaia que o Chico e o Tom levaram, por terem ganho o festival. Acredito que naquele momento eles devem ter se arrependido de ter voltado. O Tom morreu em New York. Um lugar altamente chique para se morrer. O Chico está ainda vivo. Vejo-o quase sempre que vou ao Celeiro.

Criei meus novos pontos. O Garcia Rodrigues, o Marina all Suítes, o Celeiro, quando estou em fúria gastrônomica tribunícia o Fellini, o Antiquarius... como pode se notar estreitei minhas fronteiras. Não mais vou ao Rio. Vou apenas ao Leblon.