terça-feira, 15 de setembro de 2009

O CORROSIVO DEPÓSITO DE RESSENTIMENTOS

O CORROSIVO DEPÓSITO DE RESSENTIMENTOS



Há muito que não vivo no Brasil,
Mas ali faço negócios, tenho família e
mantenho-me informado, pois, sou
assinante da globo internacional.
Por isto afirmo, vejo na violência marginal
um corrosivo depósito de ressentimentos.

Nunca precisei de profissionais que discutissem comigo o que se passa em minha mente. Outrossim, creio que para certas análises de comportamento humano, pessoas como Helio Pellegrino, são importantes, pois, ele tem a rara capacidade do entendimento em plano global, não apenas casuístico. Por isto vou apresentar aqui parte de um texto que ele escreveu a décadas, mas que até hoje pode se considerar atual, pois como ele mesmo afirma no inicio de seu texto, cada povo tem os criminosos – e a criminalidade – que merece.

Isto significa que a patogenia da violência, longe de ser explicável, a partir de uma visão catastrófica da natureza humana, cruel e corrupta em seu miolo, tem Raízes sociais e políticas que a tornam um fenômeno coletivo, passível de transformações – ou modificações – capazes de agravá-lo ou atenuá-lo. Não resta Duvida que o crime habita o coração do homem, como possibilidade inarredável. Daí, entretando a convertê-lo em destino ontológico, apto a elucidar tanto as iniqüidades da baixada Fluminense quanto a delinqüência políticas dos contras da Nicarágua, vai um abismo. Houve tempo em que Eros e Tânatos – pulsões inatas do ser humano – eram capazes de explicar guerra e paz, vida e morte. A ser assim, nada se poderia fazer. As cartas estariam antecipadamente marcadas, para o amor e o ódio, e a criminalidade não passaria de uma secreção purulenta dos instintos tanáticos – sem remissão possível.


Este modo de ver as coisas já teve o seu prestígio – e o seu fastígio – principalmente no campo da psicanálise desinformada, conformista ou reacionária. As disputas internacionais, os conflitos armados, a luta de classes, a rebelião das massas espoliadas, a violência urbana e suburbana – tudo era creditado aos instintos de morte, causa necessária e suficiente de toda a crueldade humana, pessoal ou social, onde quer que aparecesse. O caráter grosseiramente ideológico dessa visão do mundo salta a vista de qualquer um. Ela absolve os beneficiários da injustiça, da espoliação e da opressão, seja no palco nacional, seja no plano internacional. O status quo universal fica, assim justificado – e legitimado. Os grandes capitalistas – indígenas e multinacionais – superdotados de energias tanáticas, dais quais não são responsáveis, chupam o sangue dos pobres por fatalidade genético-instintiva. Estes por sua vez, ao reagirem – quando reagem – também dão mostras de frondosa musculação mortífera, que os empurra cegamente a luta.


Hoje em dia, tal tipo de pensamento, tornou-se apanágio de uns poucos – e envergonhados – rinocerontes. Acriminalidade – sabe-se com certeza – é sintoma de causas e crises sociais, políticas e psíquicas, cuja a articulação conceitual vem sendo tentada, com êxito, na área das ciências humanas. O criminoso, ao cometer seu delito, ao mesmo tempo que atua sua deformidade pessoal compõe, com eloqüente minúcia, o retrato de uma sociedade deformada e deformante, do qual é desesperadamente vitima – e desesperadamente cúmplice...

Não penso que Helio Pellegrino possa estar exagerando e muito menos possa estar errado em sua maneira de ver este problema. Problema este que ele discutiu há muitos anos atrás, onde os maiores deles estavam concentrados na Baixada Fluminense. Hoje eles podem ser notadas na Favela da maré, na Rocinha ou no morro do alemão. Eles estão no sofisticado Leblon, como no subúrbio mais longínquo. Não tem mais um alvo pré-determinado. Pode ser eu, você ou aquele visinho que você pouco vê, mas sabe que existe.

Somos vitimas de uma sociedade que durante décadas vem se deformando com exemplos vindos de cima. Sim os exemplos sempre vem de cima, seja por seu pai, seu professor, seu confessor, seu chefe, enfim naquele que você possa e pense em se espelhar.

Esta tipicidade criminológica hoje faz parte de nosso dia a dia. Ouvimos a descrição dela, comendo cereais pela manha, ou saboreando um vinho em nosso jantar. Elas são a nós trazidas, assimiladas e esquecidas num piscar de olhos, pois, na realidade aconteceram no quintal alheio. E na realidade no dia seguinte haverão outras. Logo não há tempo nem espaço de classificá-las e muito menos uma forma plausível de dissecá-las e tentar entendê-las.

Existe o morgage a se pagar, o trânsito a se enfrentar, o cliente a se visitar, as refeições a se fazer, as obrigações a se cumprir e a vida a se viver. Infelizmente é assim que na maioria das vezes encaramos toda a situação. Até que o problema bateà sua porta e você passa de expectador a vitima.
albatrozusa@yahoo.com