sexta-feira, 23 de abril de 2010

DA CARMEM MIRANDA AO PATO DONALD


TRAUMAS

Existem coisas na vida de cada um, que nos marcam. A descoberta da inexistência de Papai Noel. Que seu irmãozinho e nem você próprio foram trazidos pela cegonha. O seu primeiro beijo. A perda de sua virgindade. A descoberta do Collor, depois de ter votado nele e outras mais. Todavia, existem outras menos traumatizantes mas que infelizmente, também agem sobre a sua imaginação.

Toda vez que eu olho uma fotografia de Carmen Miranda, imediatamente meus olhos são dirigidos para aquilo que ela gostava de usar em sua cabeça. Uma espécie de turbante com frutas tropicais. Pois é, esta é a imagem que o resto do mundo tinha do Brasil, tinha naquela época.

Lembro-me que era pequeno e impressionável e li numa revista do Dysney, o Pato Donald chegando no Rio de Janeiro. Até ai nada. O problema veio a seguir. Recebido que foi pelo Zé Carioca, foi direto para a praia. Caiu no oceano de Copacabana, e imediatamente dois jacarés saíram em seu encalço.

São imagens como estas que marcam uma nação. Para muitos tudo que vem da Colômbia, está envolto em Cocaína. Tudo oriundo do sul da Itália, pertence a Máfia. Todo louro de olhos azuis desembarcado da Alemanha tem um que de nazista. Todo francês entende de elegância e gastronomia, assim como todo irlandês é um horseman e o inglês um diplomata.

Estávamos, no século passado, na era dos rótulos. Felizmente, isto me parece coisa do passado, pois, com o evento da televisão e posteriormente da internet, o mundo hoje é uma coisa só. Que pensa em conjunto e opina em bloco. Um chinês, vê um norte-americano como um ser igual, que gostam das mesmas coisas e curtem os mesmos livros e filmes.

Graças a Deus, hoje os norte-americanos têm consciência que, nós brasileiros, somos seres humanos normais. Eles ainda se espantam, que pessoas que falam uma língua incomum, quase um dialeto, possam ser mais elegantes e muitas vezes mais inteligentes, que eles próprios. Mas isto faz parte do aprendizado.

Tivemos nossos preconceitos com países menores em nosso próprio continente, e hoje até a Bolívia é capaz de nos dar uma tunda! Logo, diria que isto é uma prova de civilidade. Nossa liberdade termina, onde começa a dos outros e todo ser humano, por mais humilde que seja, tem que ser respeitado, pelo simples fato de respirar o mesmo ar que respiramos.

Tive meus rompantes de elitismo. Mas o tempo me ensinou a contê-los. Confesso que ainda existe em mim, uma tênue resistência em relação a burrice alheia. Um fator que ainda me repele em relação a quem a possuí. Outrossim, me fere mais aquele que me acha burro, pois, embora não possa me considerar brilhante, estou acima da média, mesmo que a média brasileira não seja, assim por dizer, pródiga. Vide o nosso numero de Prêmios Nobel...

Brincadeira. O povo brasileiro é esperto e sensitivo ao erro. Mas muitas vezes me exaspero com as coisas que são ditas e feitas pelos nossos políticos, que mesmo que cobradas, logo entram no esquecimento e com o tempo, apagadas da memória histórica. Isto me deixa fulo da vida, pois não acredito que exista futuro, sem passado. Assim sendo quando se apaga o passado, o que resta do futuro?

Vejam estas frases:

“Collor foi vendido durante meses como um produto industrial, um sabonete”. (1989)

“Com a experência de presidente da Republica, Collor vai certamente fazer um trabalho excepcional no Senado”. (2006)

“Adhemar de Barros e Maluf poderiam ser ladrões, mas são trombadinhas perto do grande ladrão, que é o governante da grande republica (Sarney)”. (1987)

“Uma coisa eu tenho tranquilidade, Sarney: nunca lhe ofendi”. (2006)

Podem ser estas quatro frases pronunciadas por uma mesma pessoa? Pasmem, elas foram. Aí eu me pergunto, estarrecido da mesma forma que fiquei quando vi o Pato Donald, nadar que nem um louco, com dois jacarés à sua cola, na praia de Copacabana: como uma pessoa com este perfil pode ser considerada confiável e dono de um prestigio, que segundo as pesquisas de opinião pública, está hoje, na casa dos 75%?

Será que nós brasileiros temos o mesmo perfil e por isto nos identificamos, com aquele que se pronunciou da forma acima descrita?

Espero que não, mas temo que voltemos a ser caracterizados pelos turbantes da Carmem Miranda...