domingo, 27 de junho de 2010

LER É O RENASCER DE UM NOVO DIA


ATRÁS DO TOCO
Não me levou muito tempo para figurar aquilo que eu era, o que poderia ser e como chegaria a transformar meus sonhos em realidade. Não porque eu fosse dotado de um talento especial – na verdade nunca senti tê-lo algum - mas pelo simples fato de ter pleno conhecimento de minhas limitações. E este é a base de qualquer crescimento.

Senti de cara que não seria um músico famoso, nem sequer um esportista consagrado. Minha professora de piano deixou isto bastante claro como também minhas incursões no futebol, tênis, voleibol e Jiu-Jitsu objetivaram que eu poderia sobreviver, mas nunca luzir. Quanto mais consagra-me. O pavor da constatação de uma gota de sangue, por sua vez, inviabilizava tanto a medicina quanto  uma futura carreira policial. A  falta de sociabilidade me afastava do comércio, a eterna vergonha na cara, de ser político ou diplomata, a falta de tato de ser um RP, a  incompatibilidade pelo cálculo sem criação, de ser um engenheiro, o compromisso com a verdade de ser advogado, a total inabilidade manual de me transformar num pintor, escultor, desenhista ou mesmo massagista. Logo, me sobraram pouquíssimas opções. Por isto me agarrei a algumas delas e graças ao bom Deus, sobrevivi. Pelo menos até aqui.

Desfolhando a margarida, poucas opções me sobraram, entre elas o jornalismo e a arquitetura. Meu pai não gostou. Para ele, homem que cresceu no trabalho, suou sua camisa como comerciante, jornalismo era sinônimo de pobreza e arquitetura coisa de viado. Decoração de interiores nem pensar. Era coisa de viado desvairado!

Mas quando se é jovem, a primeira coisa que o incita na vida é discordar de seus pai. Ele era Vasco, logo fui torcer pelo Flamengo. Assim sendo entrei na Universidade Santa Úrsula de Arquitetura, exatamente na época que o simples fato de ser estudante já o fazia um inimigo potencial aos olhos do presidente Medici. Estranho nome este. De um despotismo acerbado durante toda a história da humanidade... E tem gente que não acredita em atavismo nominal...

Sobrevivi a revolução, pois minha apatia para com a política serviu de antídoto à insanidade reinante. Fiquei quieto atrás do toco ao contrário da dona Dilma que explodia com a vida alheia. Mas a vontade de ler e escrever nunca se afastaram de minha forma de ser. Compartilharam minha existência até aqui e creio que seguirão meu destino até os dias finais do mesmo. Que espero que não estejam tão próximos.

Li de tudo. De Iben a Jorge Amado. De Balzac a Nelson Rodrigues. De Rimbauld a Rubem Fonseca. E o resultado? Tudo que um ser humano dotado de um QI acima de símio, possa realmente imaginar. Impressionei-me a principio, escandalizei-me, emocionei-me, exasperei-me em alguma oportunidades, apaixonei-me sempre que possível, diverti-me sempre, discordei quando necessário era, concordei, abandonei em diversas vezes por pura rebeldia, me tornei escravo de mim mesmo, chorei, ri e o mais importante de tudo, aprendi a respeitar a opinião e a maneira de ser de todo e qualquer ser humano.

Foi aí que achei um dos meus caminhos: escrever. Queria ser escritor, pois sempre me fascinou o simples fato de imaginar o que o escritor tem em mente quando escreveu aquilo que estou lendo. Como a obra de um pedreiro, colocando tijolo sobre tijolo, sem conhecer a planta final do projeto que está construindo, o papel se enche de letras. As letras formam frases. As frases em capítulos e um sonho ou uma história são criados. Para mim trata-se de um obra de arte, como a pintura ou a música. A simples descrição dos sentimentos de cada personagem é uma viagem ao intrínseco âmago de cada um. Uma janela para o infinito. Um estudo da alma humana. Um livro é algo que todos deveriam meditar e concluir. Não apenas ler. Pena que nosso presidente e sua herdeira, não sejam da mesma opinião. Ler é a base do conhecimento e a abertura da mente. Falta principalmente ao primeiro esta dádiva que Deus nos deu para então evoluirmos, como seres humanos.

Quando escrevi O SUBMARINO DA LAGOA RODRIGO DE FREITAS procurei, criá-lo colocando tijolo por tijolo sem um projeto definido. O livro foi fluindo, esgueirando-se e encontrando seu próprio caminho. Foi uma tarefa árdua, pois, minha formação de arquiteto bramia por uma linha de ação determinada. Com inicio, meio e fim. E foi o que nunca aconteceu.

Acho que ler é um hábito que se adquire e um requinte que enobrece a todos. Pena que como Chico Anysio descreveu no prefácio de meu livro, muitas obras estão destinadas ao esquecimento nas prateleiras. É a mais pura verdade. Tem gente que compra livro, apenas para decorar sua sala de estar. Quando na verdade somos um povo que lê pouco, escreve menos ainda, mas em contrapartida fala muito – pelos cotovelos - principalmente pelo ato de falar, ser de graça e não dar muito trabalho às cordas vocais.

Não quero puxar a sardinha para a minha brasa. Mas a literatura brasileira é a meu ver riquíssima. Paupérrimos, infelizmente, são aqueles que se dedicam a ela. E muitos, os que ficam atrás do toco, como eu fiquei quando ainda universitário - numa catatonia de incompetência pretensiosa e hipócrita - incorrem no erro de se recusarem a abrir suas próprias janelas para o infinito.