quarta-feira, 12 de setembro de 2012

POR FAVOR, ME DEVOLVAM O MEU RIO DE JANEIRO

Estamos a caminho de mais um carnaval. Para o carioca, ele já está ali na esquina. Os ensaios de quadra já tiveram o seu inicio. Hora de "pegar" o samba. E o carnaval é aquela época do ano, em que o brasileiro sai do ar oficialmente. Não propriamente o carioca, que já vive fora do mesmo, desde o momento que começa a andar com suas próprias pernas. Eu acho que eu já escrevi isto... Não importa. O que é importante de se dizer é que cada vez mais eu me afasto de um antigo amor: o carnaval do Rio de Janeiro. Um amor de décadas, com namoros sensacionais com a banda de Ipanema e uma vida quase que inteira com o meu querido Salgueiro. Durante anos fui presença certa em ambos. Mas o tempo passou e a coisa não me parece mais a mesma. Não é questão de idade, por que ser carioca, não tem idade. É vicio que você contrai e não se cura jamais. Mas vou tentar me explicar.

Vocês leram um livro chamado Chove sobre a minha Infância? Foi escrito por Miguel Sanchez Neto. Em uma frase, este brilhante escritor resume todo o sentimento que tinha em mim e não sabia como explicar. Ele escreveu: “Quando é que morreu esta cidade que insiste em viver em mim?” Pois é, eu não sei, mas o meu sentimento em relação ao Rio de Janeiro pode ser resumido nesta simples pergunta, que nem mesmo eu sei como responder. Ou quem sabe por covardia, eu me recuse a fazê-lo. A verdade nua é crua, que você pode até deixar o Rio de Janeiro, mas onde você estiver, lhe garanto que o Rio de Janeiro nunca deixará você.

Amo demais o Rio de Janeiro para tirá-lo definitivamente de minhas memórias, outrossim, os valores básicos, aqueles responsáveis por minha formação, foram se apagando, pouco a pouco, em mim. Procuro-os quando o visito, mas já não mais os encontro. Muitos dos quais, foram apagados por terceiros. Sim, aqueles mesmos que deram um fim ao Antonio’s, a sorveteria do Morais, que desapareceram com o cachorro quente do Genial,  com o restaurante dos Esquilos, as grandes discotecas, com os festivais internacionais de música, e os universitários também, com a magia da Montenegro, a desconcentração do Veloso, com a sedução do Le Bateaux. Que cariocas somos nós que não conseguimos renovar a volta de nós, nomes desaparecidos como os de Rubem Braga, o Tom, o Vinicios, o Carlinhos de Oliveira, o Tarso, o Henfil, o  Francis,  o Bidet  - não o aparelho sanitário e sim o Hugo - o Saldanha, o Nelson, o Sabino, o Carlinhos Niemayer, seu Canal 100, a Leila... Que me desculpe, mas amaldiço-o também a aqueles que estão reformando o Maracanã. Imaginem ter que ir ao Engenhão para assistir o Flamengo jogar. Simplesmente não existe!

Porque estou falando sobre isto? Porque um amigo me telefonou do Rio. Ele é jovem, gaúcho e pela primeira vez irá a um desfile das escolas de samba. Seu comentário foi contundente. “O Rio não se renova. Entra ano, sai ano, as coisas estão apenas mais um ano velhas”. O pior é que ele está coberto de razão. O Rio de Janeiro realmente não se renova como São Paulo. Precisamos que o Ricardo Amaral se recrie e faça do Rio de Janeiro um novo parque de diversões noturnas. Cadê a sua feijoada, cara? Hoje vivemos apenas de três fatores, que ainda trazem os turistas aos milhares para o nosso seio: As belezas naturais, o espírito do carioca e o exotismo em que ainda nos mantemos envolvidos para as populações estrangeiras. E entre estes exotismo, o carnaval é o maior de todos.

Você vê as imagens de uma novela da Globo e imediatamente redescobre o Rio de Janeiro a cada ângulo. A cada take. A cada menor detalhe. Aqui entre nós, nosso Rio é lindo de morrer. Enquanto isto quando o assunto é São Paulo, a emissora não consegue apresentar, mais do que duas únicas imagens que são repetidas continuamente, a da nova ponte suspensa e o trânsito nas marginais a noite. Por isto São Paulo necessita se renovar. E o tem feito bem, diga-se de passagem.

O carioca por sua vez é o único povo, entre os diversos existentes no Brasil, que vive de um estado de espírito. Possuí uma capacidade impar de sarar as suas próprias chagas, de dar a volta por cima mesmo perante as maiores adversidades, de com um jogo de cintura sempre dar um jeitinho de achar que o minuto seguinte será melhor do que o anterior. Esta é a verdadeira energia desta cidade.é isto que os que não a habitam sentem ao andar por suas calçadas.

A cada apresentação do jornal Nacional, você é tomado pela nítida impressão que o Rio de Janeiro não é mais viável. A cada resultado depois das chuvas passamos a ter noção que nada foi feito, é feito ou será feito. E o pior. Nos imbuímos daquela premonição que no ano seguinte aquelas mesmas imagens se repetirão.  Convivemos com o infortúnio, troçamos do mesmo, deixamos para o dia seguinte o que não se fez hoje e que possivelmente nunca será feito, fingimos acreditar que as coisas irão mudar, que alguém está preocupado com nossas infelicidades. Doce ilusão. Gostamos de nos enganar e colocar nas mãos de Deus, um destino que ele nos deu a liberdade de traçar. Mas a cada queda este povo abençoado se levanta sara a sua ferida e a transforma em vida como diria a canção de Gil e Milton.

Sofremos de amnésia crônica, de uma irrecuperável efemeridade e acima de tudo, nos damos ao luxo de desprezar nossa própria história. Não cultivamos a aqueles que fizeram de nossa cidade a maravilha que um dia foi e nas regiões mais recônditas de nossa alma, continuamos a crer em premissas e promessas.

Um conselho de quem viveu 2/3 de uma vida, muito bem vivida nesta cidade. Se alguém quiser odiar o Rio de Janeiro, não passe por lá, pois, caso contrário será envolvido por sua magia e ficará que nem eu contando os minutos para lá voltar, mesmo sabendo que irei me decepcionar.