sábado, 9 de agosto de 2014

REGRESSÃO

Pode parecer saudosismo, mas em meu tempo de calças curtas e adolescência, o futebol, era bem mais divertido, muito mais mais criativo e eu diria que havia paixões de ambos os lados: tanto na na arquibancada quanto no campo. Tínhamos um espetáculo alegre e permeado de muita emoção. Hoje somos obrigados a assistir a um desenvolvimento de pseudo táticas preenchimentos de espaço que acabam se transformando, dependendo da qualidade dos jogadores, quase sempre em cruentas batalhas campais. Dentro e fora das quatro linhas. Ademais, havia maior amor a camisa. Um jogador iniciava e terminava sua jornada profissional em um mesmo clube. Você reconhecia no Zico, o Flamengo. No Roberto Dinamite, o Vasco. No Garrincha uma estrela solitária e num Castilho o pó de arroz. Pelé, era Santos e o Ademir da guia, Palmeiras. Hoje com qual clube você reconheceria por exemplo o Sheikh? Vejo hoje jogadores beijarem os escudos de seus times com trejeitos melodramáticos, e em alguns casos, pateticamente se recusarem a comemorar um gol feito no ex-clube. Outrossim, no final da temporada, mudam para outros clubes, voltam a beijar seus novos escudos e a se recusar a comemorar outros gols em seus ex-times. Tudo marketing. É ou estou ficando velho ou deve ser saudosismo mesmo...

Hoje, a preocupação daquele que se considera um grande craque, não é mais com o drible,o gol de placa ou simplesmente a molecagem e sim com o corte do cabelo, o chapéu a usar na coletiva da imprensa e uma forma de promover a marca da cueca que usa. Diferenciado hoje, não é mais pelo que se faz em campo, mas sim pela tonalidade dada ao couro cabeludo, ou ao tamanho do brinco usado. Vejo com temor que um dia os jogadores poderão trazer para dentro de campo seus exagerados carros e seus pesados relógios.

Chegamos a ser os melhores do futebol, pela molecagem e a "imprevisivilidade" de nossa atuação, apenas dentro do campo. Atualmente, ela se dá apenas fora dos estádios.  Hoje o futebol é tremendamente previsível. Até a Alemanha que acabamos ver sagrar-se campeã, apresentou um futebol previsível. Altamente producente, letal e eficaz, mas previsível, quase burocrático. Nada que pudesse a se comparar a nossa seleção de 70.

Vó Adelina sempre me lembrou que o exemplo sempre vinha de cima: dos pais, dos professores, dos dirigentes. Está certo que a sociedade brasileira vive um momento anárquico, onde ninguém mais tem noção de quando termina a sua liberdade e se inicia do outro. Nossos protestos são invariavelmente seguidos de depredações. Os discursos politicos estão cada vez mais vazios e destituídos de um mínimo de verdade. Os dirigentes de nossos clubes, federações e confederações, aparentam ter o mesmo perfil dos mensageiros. E qualquer guri capaz de dar mais de três dribles, imediatamente é exportado para um clube da Europa. Ninguém mais se preocupa em sequer forma-lo. Querem apenas contabiliza-lo. Mas daí, na hora que se leva de sete no Maracana, culpa-se o apagão, clama-se por imediatas mudanças, e com o passar dos dias,  o que acontece? A CBF trás de volta o Dunga, o Flamengo, o Luxemburgo, o Grêmio, o Felipão e a turma do mensalão volta a ter os mesmos privilégios. Durma-se com um barulho destes...

Hoje nossas arenas futebolísticas cobram preço de Broadway e apresentam espetáculos de vaudeville. Existem mais mortes e mutilações dentro e nas cercanias dos estádios, que propriamente nos logradouros públicos. Clubes não pagam seus impostos, não cumprem em dia com as obrigações de seus assalariados e mesmo assim não param de adquirir jogadores em final de carreira a preços de ouro. E quando algo se sucede - como a debandada dos torcedores dos grandes clássicos - estes mesmos clubes apelam para o pseudo profissionalismo e montam esquemas de angariar sócios torcedores e assim retirar, ainda mais dinheiro do bolso daqueles que só cometeram um erro em suas vidas: apaixonaram-se por seus clubes.

Criticas são sempre bem vindas, quando feitas de forma construtiva. Eu mesmo sou portador de enumeras. Todavia, quando se reconhece o problema e não se tem uma solução para a sua causa, o melhor é deixar na mão daqueles que tem mais experiência no assunto e torcer para que estes possam assumir os posicionamentos corretos. Cabe a nós votar em gente que possa realmente solucionar nossos problemas e lutar por nossas causas. Seja para sua agremiação futebolística ou principalmente para o governo que nos administra.

O futebol, não pode se dissociar da sociedade em que vivemos. E os exemplos vindos de cima, fazem os clubes, copiarem os maus exemplos e se valerem dos mesmos expedientes para driblar suas verdadeiras obrigações. Somos ainda o pais que gosta de levar vantagem em tudo. Uma nação que necessita de um "paizão", seja ele o Getulio, um "cumpanheiro" ou o Felipão. Uma sociedade que troca seu voto pelas migalhas dadas pelo governo. Que depende de um governo que baixa as taxas dos fabricantes de carro, esquecendo-se que não há fluxo financeiro na população, para esvaziar os patios das montadoras.  Que culpa a natureza pela falta de um planejamento energético. Que ainda idolatra a Xuxa e ri dos nomes dados as operações da policia federal no combate as mazelas diárias de nossos politicos e agregados aos mesmos. E o que tudo isto gera? De uma hora para outra, perdemos aquilo que melhor fazíamos: jogar futebol.

Não se enganem, regredimos em todos os sentidos. No futebol também. Não tenham dúvidas disto. Não é saudosismo nem muito menos caduquice. Afinal se o simples fato de querer comparar o Maradona ao Pelé, já é uma impropriedade, o que dizer  então de fazê-lo em relação ao Neymar? Teria apenas uma resposta: regressão.